21 maio 2010

Viva a crise

Apesar de serem vendidos ao simpático preço de 56 euros por dia, os bilhetes foram vendidos a muito bom ritmo, levando mais uma vez, à cidade do rock, largos milhares de pessoas.

Assim sendo, parece que, afinal, o panorama económico e financeiro do nosso país não é tão negro como o pintam, pois se há tanta gente disposta a dar 56 euros para um só dia de música ao vivo, sem contar com a despesa adicional que, provavelmente, fará dentro do recinto - quanto mais não seja, em alimentação – e se, por outro lado, um conjunto de empresas nacionais se predispõe a patrocinar as extravagâncias e os elevadíssimos cachets de muitos dos artistas de top mundial que nos vêm visitar, é porque as coisas não podem estar assim tão más. Ou estarão só para alguns?

Juntamos a isto o facto de, em cinco dias de concertos, apenas constarem cinco projectos nacionais no alinhamento do palco principal, cinco em 21 nomes: Mariza, João Pedro Pais, Xutos & Pontapés, DZRT e o sempre bem-vindo regresso dos Trovante. E o resto? É paisagem?

Se calhar o problema não está na carteira, mas na cultura. Viva a crise.

13 maio 2010

Cuidado com os exageros

O Papa visitou Portugal. Só por si, este deve ser um motivo de orgulho para cada um de nós, os que habitamos e todos os dias construímos este país da Europa ocidental. A mais alta figura da Igreja Católica passou por Lisboa, Fátima e Porto, arrastando consigo centenas de milhar de pessoas: crentes, admiradores, seguidores e simples curiosos.

Tudo muito bem, a não ser o pequeno grão de areia que, mais uma vez, veio perturbar a engrenagem de uma nação que sempre quis mostrar ao mundo uma força que não tem, e quase sempre se deu mal com isso. Cadeiras construídas de propósito, microfones de ouro, um palco no valor de 200 mil euros... tudo somado, cada família portuguesa doou em média 500 euros para que a visita de sua santidade, o Papa Bento XVI, estivesse rodeada de todos os luxos possíveis, alguns deles completamente supérfluos e contornáveis.

Depois temos a outra face, a face de muito boa gente indignada com o corte das ruas, a retirada dos caixotes do lixo, a segurança apertada e até, imagine-se, com a tolerância de ponto concedida pelo governo português aos trabalhadores da função pública. Muita desta gente revestiu-se de falsos moralismos, sendo a mesma gente que aplaude os milhões (muitos deles) gastos em vão com a organização de um europeu de futebol, uma corrida de aviões ou até mesmo a convocação de uma greve encostada ao fim-de-semana, já para não falar da constante abertura de novos centros comerciais, que brotam da terra como cogumelos. Há ainda quem diga coisas como: "tanta coisa por causa do Papa?! Ele é uma pessoa igual às outras!"

Aviso à nação portuguesa: para um lado e para o outro, para o bem e para o mal... cuidado com os exageros.

07 maio 2010

Roubo de redacção

De facto, já nada me espanta… vejam só que, esta semana, um deputado do partido no poder, descontente com o desenrolar de uma entrevista que lhe era feita, resolveu cortar o mal pela raiz e toca de levar consigo os dois gravadores usados pelos jornalistas que o entrevistavam.

Como se não bastasse, nesse mesmo dia, entregou-os ao tribunal, como apensos a uma providência cautelar que visava a não publicação das imagens de uma câmara que, para sua pouca sorte, também captou o hilariante momento.

Horas mais tarde, ironicamente, convocou a “tribo jornalística” nacional e apelidou de “irreflectido” o acto de cometera. O problema de Ricardo Rodrigues – assim se chama o infractor – é que já foi tarde para imendar aquilo que acabou por se tornar num grandessíssimo tiro no pé. Passou a ser mais afamado, mas pelos piores motivos.

Vejam só que belo exemplo nos dão aqueles que, supostamente, nos deveriam representar e que afinal… andam a cortar os tempos de antena que não lhes interessam. Claro que, como em todos os casos, não pode pagar o justo pelo pecador, não podemos meter tudo no mesmo saco.

Isto foi censura? Claro que não! Foi apenas um “acto irreflectido”. Mas, Sr. Deputado, reflicta lá agora comigo: bem vistas as coisas, até teve sorte… imagine o Sr. Deputado se a entrevista tivesse sido numa rádio: é que levar um microfone, uns auscultadores, uma mesa de mistura e um computador ainda é coisa para dar cabo das costas a uma pessoa! E nem sequer cabem no bolso!

12 março 2010

Falta de educação

Mais uma vez, foi precisa uma vítima para muita gente acordar. Desde que o Leandro resolveu pôr fim à vida que praticamente não se fala de outra coisa: bullyng para aqui, bullying para ali, como se o fenómeno só agora começasse.

E quanta hipocrisia, quanta falta de carácter. A escola Luciano Cordeiro, que durante sabe-se lá quanto tempo esteve cega, surda e muda perante o sofrimento diário, físico e psicológico, de um dos seus alunos, foi a mesma escola que, uma semana depois da tragédia, chorou lágrimas de crocodilo pela perda do Leandro. Depois, lá vem a história dos números e dos registos: "não há registos de queixa", argumentam alguns dos supostos responsáveis por aquele estabelecimento de educação - sim, de EDUCAÇÃO. E o resto... é silêncio. Ninguém fala, ninguém dá explicações, abrem-se inquéritos, vai-se atirando areia para os olhos, o tempo vai correndo, até que tudo caia no esquecimento e as coisas voltem ao anormal.

Mas quantos Leandros há ainda por conhecer? Quantas vidas mais vão ser precisas para pôr na ordem (leia-se educar verdadeiramente) um conjunto de pseudo-futuros homens mal formados, que só se sentem bem a pisar quem lhes aparece à frente? Onde está a verdadeira e digna autoridade do Professor? E a competência dos conselhos executivos, onde está? E o respeito pelos outros?

A nenhuma destas perguntas soube responder o professor que, nos últimos dias, se atirou ao rio Tejo e pôs fim, da maneira mais fácil, a horas e horas de desrespeito por parte dos seus próprios alunos, aqueles a quem tentou dar alguma educação.

Perante isto, será que tudo vai continuar na mesma? É muito provável. Mas sinceramente, muito sinceramente, esperemos que não.